# PCO: reflexões críticas de egressos do Partido
15/3/2020
## 1. Considerações preliminares
Este texto é elaboração de egressos – militantes e funcionários – que atuaram no Partido da Causa Operária (PCO), alguns por anos a fio, todos atuantes também no contexto de atividades intensas da luta contra o golpe de estado de 2016. Foi escrito tanto por necessidade de compreensão e balanço da experiência, quanto pela possibilidade de oferecê-lo como meio de diálogo a camaradas de luta que saíram do Partido. É um breve apanhado de reflexões sobre o funcionamento interno do PCO e seus problemas, por parte de quem os viveu na prática e se viu na contingência de tentar sem sucesso superá-los dentro do Partido.
Não se trata de uma caracterização histórica do PCO à luz do contexto político mais amplo. Há escritos de outros autores sobre o assunto, incluindo artigos na revista [Textos](https://www.causaoperaria.org.br/textos/?p=2614) do próprio Partido ou no jornal [Gazeta Revolucionária](http://www.gazetarevolucionaria.com.br/index.php/politica/950-avalpco).
Não é um tratado acadêmico cheio de citações, não é um ensaio pessoal, nem um instrumento de crítica interna ao PCO. Não se trata de um manifesto político nem uma acusação moral, e menos ainda sentença condenatória. Buscou-se escrever de modo simples e autoexplicativo, sem jargões ou enxertos pedantes, de modo a permitir o diálogo sincero com aqueles que possam ter interesse no texto para além das “regras de debate” internas desse tipo de organização.
Na interface com outros grupos, outras linguagens, outros interesses, é possível romper o muro de isolamento que o PCO construiu para si. À medida em que tal muro é demolido, as consequências dessa ruptura estarão nas mãos do próprio PCO, e não dos que escrevem este texto.
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O texto se divide em três partes. A primeira trata do problema basilar do Partido: o fundamento idealista de sua política, intimamente relacionada à manutenção da estrutura de poder individual de seu presidente. Faz-se necessário, por isso, uma avaliação de alguns dos mecanismos internos de manutenção do poder: a urgência constante, o combate às divergências internas, o sistema de vigilância e coação, a desorganização como ferramenta de controle, os métodos de discussão, o fluxo de entrada e saída de militantes, a relação do Partido com os demais aspectos da vida do militante. Em seguida, abordam-se os vícios da política partidária decorrentes dos mecanismos de manutenção do poder descritos: a ausência de trabalho de base, o ultrassectarismo, a análise como ferramenta de bloqueio à ação, as consequências para a imprensa partidária. Por fim, aventam-se algumas possibilidades de atuação política para o ex-militante do PCO, com vistas a superar os aspectos negativos da experiência do partido, aproveitando o acúmulo de experiências.
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## 2. “A vontade de Rui se impõe”: fundamento idealista do vício político do PCO
Embora se coloque como um partido materialista, seguidor ortodoxo do marxismo, o Partido da Causa Operária trabalha a partir de um fundamento idealista. Há apenas um núcleo pensante no partido – ou, verdade seja dita – um indivíduo autorizado a pensar: Rui Costa Pimenta.
Como se sabe, quanto mais individual o fundamento de qualquer análise, mais próxima do idealismo – mesmo mantida a base dialética. A ascendência das das condições materiais operadas socialmente sobre aquelas idealizadas na mente do indivíduo está no cerne da contribuição de Karl Marx ao debate filosófico de sua época, e é a pedra de toque do próprio marxismo. Se para o materialista “a realidade se impõe”, para o idealista “a sua vontade se impõe”.
Dentro do funcionamento interno do PCO, nada de importante é conduzido sem que seu presidente, Rui Costa Pimenta, tenha proposto ou autorizado. Pode-se argumentar que tal condição de funcionamento é própria do centralismo democrático, e portanto do Leninismo. Mas mesmo dentro de tal lógica, de modo a libertar um partido revolucionário dos caprichos de seus próceres, os mecanismos naturais seriam a disputa interna saudável, a alternância de poder, os momentos de crítica e autocrítica dentro das instâncias partidárias. No PCO, não há tal alternância. A presidência do Partido sempre foi exercida por seu fundador. O processo eleitoral interno tem somente uma chapa, cujos membros são indicados pelo próprio Rui Costa Pimenta.
Por mais disciplinado, por mais rigoroso, por mais coerente que o indivíduo seja, não é possível a uma organização política marxista se submeter unicamente aos desígnios de tal pessoa sem comprometer radicalmente o fundamento materialista de sua política. É o que ocorre no PCO. Tal fundamento está de tal maneira viciado que o partido se confunde com a pessoa de Rui Costa Pimenta e mesmo com sua família, numa relação extremamente personalista.
O reflexo mais nítido de tal quadro político personalista foi o progressivo aparelhamento dos cargos-chave do partido pelos filhos de Rui Costa Pimenta, Natália Pimenta e João Jorge Caproni Costa Pimenta, que assumiram sucessivamente a Secretaria de Organização e a Secretaria Nacional de Agitação e Propaganda. Ambos, cada um a seu tempo, foram alçados à direção do partido quando contavam com pouco mais de 18 anos de idade. Segundo seu pai, exclusivamente “por seu próprio mérito como militantes”. Recentemente, chegou-se mesmo a nomear o caçula, o adolescente Carlos Henrique Caproni Pimenta, como coordenador do Comitê de Autodefesa do Partido. É evidente que tais adolescentes não tiveram nem têm experiência ou acúmulo para dirigir o partido – quando muito poderiam estar à frente da Aliança da Juventude Revolucionária ou outros movimentos de jovens.
Como em qualquer relação de poder, a reverência por Rui Costa Pimenta e por sua família se dá por sua posição de mando dentro do Partido, e não pelo trabalho. O fato de que a própria família não reconheça tal situação – ou pelo menos não dá mostras de reconhecê-la – nada mais é que a confirmação dos efeitos perniciosos do caráter individualista e idealista da direção do Partido, incapaz de enxergar até mesmo a realidade de sua própria organização que não por seu próprio viés.
Pode-se tratar do problema segundo o jargão preferido. O que o senso comum chama de “isolamento do poder”, o mundo da gestão pública chama de “insulamento burocrático”, a tradição marxista chama de “centralismo burocrático” não tem outro efeito senão: a captura de uma organização política por um grupo que opera os mecanismos internos de modo a favorecer a sua própria permanência no poder.
## 3. Mecanismos de manutenção do poder
### 3.1. Teoria da revolução iminente
O leitor que abre as páginas da imprensa da Causa Operária desde os anos 1990 é levado a acreditar que a crise do capitalismo chegou a um tal ponto em que uma grande revolução é iminente, a qualquer momento. Todos os atos, todas as greves, todas as atividades políticas são tratadas com alarme e urgência. É tática análoga à de seitas apocalípticas, e um estímulo a que os militantes larguem de seus cuidados pessoais e profissionais para se lançarem de corpo e alma na “luta revolucionária” supostamente travada pelo partido. Como se verá abaixo, é uma engrenagem que funciona de mãos dadas com a ausência de verdadeiro trabalho de organização de base, o qual sempre é preterido em favor da “luta revolucionária” do momento.
A “teoria da revolução iminente”, por assim dizer, permite ainda que o PCO organize a estrutura do partido e o modelo de militância de modo análogo ao de outras organizações que de fato se encontravam em situações revolucionária em outros momentos da história. Adotam-se como modelos tanto a organização do partido bolchevique à época da revolução russa quanto a organização do Socialist Workers Party (SWP) americano durante a 2ª Guerra Mundial (acreditava-se que seu fim traria as condições revolucionárias ao Ocidente). As principais consequências são justamente a concentração do poder e centralização das decisões, bem como a defesa intransigente do militante/combatente “profissional” em detrimento do “diletante” (um trabalhador com emprego fora do partido).
A “revolução iminente” no caso brasileiro é uma narrativa sem qualquer amparo na realidade nacional, dado o nível de refluxo das organizações dos trabalhadores. Tal leitura inverossímil ganhou ares mais concretos a partir dos atos de rua de 2013, a partir da crise de 2008, anunciando que uma agitada maré política atingiria o país. Isso permitiu ao partido chegar a um certo crescimento ao substituir a “luta pela revolução” pela “luta contra o golpe” – por sua vez, uma narrativa hoje com cada vez menos capacidade agregadora, que o PCO vem tentando substituir pela campanha do “Fora Bolsonaro”. Além disso, como se verá, se há alguma mínima chance de que o país chegue a uma situação revolucionária num futuro próximo, o PCO estará bem longe de ter capacidade de liderança ou influência para conduzir a classe trabalhadora a uma eventual tomada do poder.
O público-alvo preferencial é o elemento de classe média sem histórico de militância em outros movimentos, que deseja se encaixar de modo quase instantâneo na luta revolucionária de sentido urgente que o partido diz empreender, ou na campanha do momento -- como a *luta contra o golpe*. Ele não apenas será menos capaz de identificar os vícios internos do Partido, como também tenderá a ter maior engajamento que um operário -- normalmente com horários menos flexíveis para militância, menos tempo disponível e menos dinheiro para despender nas inúmeras campanhas do PCO.
A similaridade com seitas apocalípticas não vem ao acaso. Em muitos aspectos, o PCO funciona como uma seita: culto a um único líder/fundador; crença de que a organização é a única a conhecer a “verdade” (no caso, o “verdadeiro marxismo”); incentivo ao afastamento da família, da profissão e da vida fora da organização; atividades exaustivas que ocupam ao máximo o tempo do militante; falta de transparência nas contas; demonização dos egressos etc. O propósito é estabelecer um micro-poder dentro do PCO, de modo a colocar o “melhor das energias” de cada participante a serviço do Partido, a qualquer preço.
Como em qualquer seita, os dirigentes do PCO só admitem críticas formuladas segundo suas próprias regras de argumentação, ou no caso a sua própria interpretação do marxismo. Por exemplo, não se pode questionar a prática de nepotismo por Rui Costa Pimenta, pois tal crítica seria “moral” e não “política”. Mais “critérios de admissibilidade” de críticas exclusivas do Partido são usadas para regular sua relação com o trabalho dos militantes, como se verá adiante.
### 3.2. “Campanha contra o partido: o que é e como combatê-la”
O PCO não admite a existência de tendências divergentes permanentes dentro do Partido. Em tese, é admitida a formação de tendências somente em questões específicas. Na prática, qualquer divergência recebe o rótulo de “campanha contra o Partido”: é identificada, relatada em reuniões da direção, e duramente combatida pelo segundo escalão.
A Direção considera como “campanha contra o Partido” não apenas divergências quanto à linha política, como também toda crítica a qualquer aspecto de qualquer atividade. Nas Universidades de Férias, por exemplo, com grande afluência de público externo, a Direção se reúne diariamente – às vezes até mais – para discutir as “campanhas contra o Partido” que afloraram no dia, e como vêm sendo acompanhadas pela direção e pelos militantes. São consideradas “campanha contra o Partido”: queixas sobre atrasos, limpeza, qualidade da comida, natureza das atividades. Comer fora da atividade durante sua realização ou trazer comida de casa para consumo próprio também é “campanha contra o Partido”. Segundo Rui Costa Pimenta, as queixas sobre temas secundários escamoteiam divergências políticas que os participantes da atividade têm mas não elaboraram por medo ou incapacidade.
O método de combate é feito à base da desmoralização e se necessário da intimidação direta. A desmoralização é feita por Rui Costa Pimenta nas reuniões diárias, evidenciando que o autor da crítica a faz por ter algum tipo de debilidade de caráter, de formação política ou de classe social. Normalmente se atribui ao queixoso algum apelido humilhante, pelo qual ele passa a ser referido por Rui e pela Direção internamente. Um militante é então destacado para conversar com o queixoso e acompanhá-lo, contrapondo qualquer crítica diante de terceiros, se voltar a acontecer. É claro que tal método gera um clima de constante policiamento e repressão que, por si só, transforma a atividade em verdadeiro suplício para todos os envolvidos – vigilantes e vigiados.
### 3.3. Vigilância e delação
A vigilância ocorre em todos os níveis de comunicação do PCO. Por exemplo, é proibido aos militantes criar grupos de suas células em aplicativos de mensagens (Skype, Whatsapp etc.) sem que nesses grupos estejam presentes todos os membros da chamada Direção Executiva do Partido (aproximadamente 15 pessoas). Qualquer queixa, qualquer questionamento das ordens da Direção, é visto, anotado e tratado como problema a ser resolvido pela Direção – quer seja em sessões privadas quer seja em sessões abertas. Aparentemente, na visão da Direção, nada que acontece no Partido pode escapar a seu controle direto.
A vigilância mútua entre os militantes passa a ser então o cerne da prática política do PCO. A delação de companheiros por seus erros é valorizada no Comitê Central e vista como sinal de firmeza e comprometimento político por parte do delator – mais ainda se acompanhada de um veredito. Se um militante apresenta um pretexto pouco convincente para não comparecer a uma atividade, tal pretexto é esmiuçado até mesmo em reuniões do Comitê Central, e caracterizado como falta de compromisso político. O faltoso normalmente é também apelidado e seu comportamento passa a ser tratado como exemplo de “conduta pequeno-burguesa” para os demais.
### 3.4. Coação
Em geral, a direção recomenda que o trato com os militantes seja “sereno e firme”. Na prática, o trato é normalmente rude ou esnobe. Quando presente em atividades partidárias, o presidente frequentemente trata com rispidez os militantes e funcionários encarregados do serviço, dirigindo-lhes impropérios como “débil mental”, “inútil”, “cérebro de frango”, “filho da puta”, caso determinado pedido não chegue, tarde ou seja executado com erro. Nenhum elogio ou incentivo é feito senão raramente e em tom condescendente. É claro, tal prática se estende por todo o partido: se uma atividade é bem-sucedida, é graças ao “acerto da política” do Partido, ou graças à “intervenção tempestiva” de algum membro da Direção. Se é deficiente, de algum modo, é culpa da falta de convicção política dos militantes que não se esforçaram o suficiente.
A conclusão lógica é que o Partido e sua direção não erram nunca, e que Rui Costa Pimenta é infalível. Logo, torna-se legítimo usar todo método coercitivo para estimular os militantes a cumprirem suas tarefas conforme as metas e prescrições da Direção. O mais comum é a ameaça de desmoralização nas reuniões do Partido. É habitual, em todo caso, sobretudo nas Universidades de Férias, que pessoas em conflito com a direção sejam ameaçadas de espancamento ou sejam expulsas da atividade.
Houve universidades de férias em que foram montados grupos de segurança armados com porretes e *tasers*, encarregados de circular de noite nas áreas externas, pretensamente para a proteção contra invasores, mas na verdade com a finalidade de vigiar o acampamento, informar à direção o comportamento individual dos participantes e até mesmo debelar eventuais reuniões indesejadas entre os participantes menos submissos à “centralização” da atividade. Ironicamente, tais “dissidentes” via de regra são justamente os proletários da atividade.
As ameaças mais diretas e abertas são feitas a egressos do Partido. Tão logo um militante se desligue do PCO, passa a ser visto como inimigo a ser difamado nos círculos internos. Caso se manifeste criticamente ao Partido em público, é imediatamente combatido e ameaçado pelos militantes.
### 3.5. Falso debate interno
Reza a tradição do centralismo democrático, devidamente transcrito nos manuais internos do PCO, que é permitido haver ampla divergência política interna, e que tais divergências devem ser exaustivamente discutidas à luz do marxismo dentro do Partido, de modo a produzir consenso ou, em último caso, para que se chegue a uma posição majoritária sobre determinada política. Tal procedimento garantiria coesão e unidade na ação externa dos militantes.
De fato, há discussões exaustivas dentro do partido. Elas seguem, porém, a regra simples de qualquer centralismo burocrático. A posição do presidente é sempre aquela defendida pela maioria dos presentes em qualquer reunião partidária. Cabe a todos simplesmente ouvir a “orientação” emanada da Análise Política da Semana e segui-la. Caso um militante local discorde da orientação, é visto como “problemático” e um caso a ser acompanhado pelos dirigentes.
Não há qualquer possibilidade de reversão de uma orientação colocada na “Análise Política da Semana”. O militante divergente é inicialmente instado apenas a “resolver seu problema no âmbito da célula”. Caso o coordenador da célula não consiga convencê-lo, é então orientado a escrever à direção partidária, de modo que o “problema” possa ser tratado “democraticamente” em instâncias mais amplas. O que ocorre, na verdade, é que se alguém envia uma carta à direção do partido, ou bem ela não tem qualquer resposta (sua carta sequer é lida pela Secretaria de Organização), ou bem – em crises agudas – algum dirigente nacional é encarregado de “resolver o problema” em alguma reunião online até que o queixoso ou bem desista de argumentar ou bem desista do Partido.
Os militantes são desestimulados a levar documentos com divergências a congressos ou conferências partidárias. Tal atitude é vista como “erro de método” ou facciosismo. O “método correto” praticado pela direção em todas as reuniões partidárias é, colocada a divergência, estimular que todos os dirigentes alinhados à política do presidente se pronunciem, numa longa e monótona sucessão dos mesmos argumentos. Caso algum se omita, é instado por aplicativo de mensagens a intervir “defendendo a política do Partido”. Trata-se do procedimento clássico de qualquer burocracia institucional: um monólogo travestido de debate, em que o divergente é frequentemente vencido pelo cansaço e pela repetição, e não por superioridade argumentativa.
Ao associar esse procedimento com o de vigilância e perseguição, percebe-se que o foco principal da Direção partidária está no controle de iniciativa. Para desvios ou queixas feitas no calor de uma atividade, o partido toma a iniciativa de “discutir politicamente o problema”. Para reclamações expressas, elaboradas de modo sistemático, nenhuma resposta.
### 3.6. Argumentação falaciosa
As reuniões de “discussão política” são longas e cansativas porque são conduzidas à base de argumentos falaciosos recorrentes. O mais comum é a *falácia do espantalho*, ou, nos termos da Wikipedia:
> um argumento em que a pessoa ignora a posição do adversário no debate e a substitui por uma versão distorcida, que representa de forma errada, esta posição. A falácia se produz por distorção proposital, com o objetivo de tornar o argumento mais facilmente refutável, ou por distorção acidental, quando o debatedor que a produz não entendeu o argumento que pretende refutar.
Por exemplo, se um militante critica o modo como o Partido se organizou (ou se desorganizou) num ato, é comum a resposta: “então você acha que um partido revolucionário não deve participar de atos?”. Ou, se há uma queixa sobre a falta de revisão do Jornal da Causa Operária, ou sobre a cota de vendas de cada militante: “então você acha que o partido não deve ter jornal, e que militante não tem que vender jornal?”. Essas falácias são apenas o preâmbulo de uma longa pregação, por todos os presentes, não sobre o problema colocado, mas sobre generalidades como “a importância de participar de atos”, ou “a importância da imprensa operária”.
O caso mais gritante é quando se questiona a direção sobre a ausência completa de prestação de contas internas, mesmo na esfera do comitê central. Não se sabe quais os salários dos dirigentes, não se sabe quais os custos operacionais da Direção Nacional. Questionada, a direção responde, em tom de deboche: “você defende então que um partido revolucionário tenha suas contas completamente abertas para a Justiça Burguesa? Que tipo de revolucionário é você?”. Evidentemente, o questionamento é sobre prestação de contas interna, e não o relatório contábil exigido pelo TSE.
Se o militante se descuida e coloca várias críticas na mesma intervenção, soma-se a essa técnica de resposta a da *digressão*, ou fuga do tema. Ou seja: escolhem-se pontos menores do conjunto da crítica para então dissertar longamente sobre eles, deixando as questões verdadeiramente nevrálgicas sem resposta.
Como praticamente não há proletários atualmente entre os quadros do Partido, outra falácia mais comum é o argumento *ad hominem*, em que se ataca o crítico e se deixa de lado o verdadeiro mérito da questão. Todas as críticas, todas as vacilações, todas as dúvidas, todas as evasões são atribuídas à classe social do militante *pequeno-burguês*. A *Esquerda Pequeno-Burguesa*, para o PCO, são todos os demais partidos de esquerda aos quais o Partido se opõe frontalmente.
No campo pessoal, portanto, tratar um camarada por *pequeno-burguês* é considerado ofensa grave. Um arremedo descontextualizado do que ocorreu em outros momentos em partidos verdadeiramente operários e populares em situações revolucionárias concretas.
Está implícito nessa tática que a direção seria formada por versões contemporâneas de Marx, Engels, Lênin, Trotsky ou Cannon, e que o partido seria verdadeiramente operário. A realidade é oposta: a direção do PCO é completamente formada por representantes típicos da pequena-burguesia que não abandonaram qualquer de seus vícios: são dados a quixotismos, pruridos e histerismos moralistas típicos dessa classe.
Uma linha separaria a pequena-burguesia militante da pequena-burguesia dirigente: segundo esses últimos todo burguês ou pequeno-burguês que se dedica de modo parcial à atividade partidária (ou seja, mantém seu emprego, seu círculo de amigos, as atividades familiares) está sob constante pressão da direita, e deve ser tratado como mero diletante. Como o partido quase não possui representantes do proletariado, os únicos “verdadeiros operários revolucionários” são os dirigentes do Partido ou os militantes profissionais que os assistem diretamente. Todos os demais estão sob constante ameaça de serem tachados de *pequeno-burgueses*: uma desmoralização.
Tais recursos demonstram que não há qualquer “ampla divergência interna” no PCO, contraposta à “unidade na ação externa” própria do Centralismo Democrático. Há apenas um aparato burocrático montado para suprimir as divergências. A direção partidária frequentemente se gaba de ser “a mais democrática e transparente do país”, já que promove um grande número de reuniões, plenárias, conferências e congressos. Tais práticas na verdade, conduzidas conforme descrito, somente tornam mais frequentes os rituais de persuasão por cansaço e de vigilância e controle sobre as divergências e seus autores.
### 3.7. Um Comitê Central figurativo
O Comitê Central Nacional (CCN) do PCO é composto por entre 20 e 30 dirigentes de todo o país. Reúnem-se mensalmente em São Paulo em data definida sempre às vésperas dos encontros – muitas vezes colidindo com outras atividades do próprio Partido. Transporte, hospedagem e alimentação correm por conta dos próprios dirigentes (qualquer que seja sua origem).
Habitualmente, as reuniões duram um dia inteiro. Após a exposição da pauta, Rui Costa Pimenta faz uma análise de conjuntura sintética, a que normalmente se segue uma demorada sucessão de prolixas intervenções de ao menos dez dirigentes repetindo os mesmos argumentos, análises, e conclusões. Quanto maior a proximidade de seu discurso com o do presidente, maior a honra do orador. Não há controle de tempo de intervenção.
Discutem-se então as ausências e atrasos dos próprios membros do CCN. Normalmente há longas preleções de Rui Costa Pimenta sobre os “problemas políticos” dos faltosos, e os dirigentes da mesma regional fazem uma série de relatos sobre seus problemas de comportamento. Tanto quanto possível, expõem-se e discutem-se todas as ausências e pretextos para omissões, expondo detalhes da vida íntima do dirigente, seguidas de julgamento e veredito também exaustivamente repetido pelos demais em tom condenatório. É frequente que esses tribunais morais tomem grande parte da reunião.
A pauta da reunião raramente é contemplada na íntegra. Normalmente, sequer metade dos temas são tratados. Isso porque ou bem se discutem generalidades na análise de conjuntura, ou se discutem minúcias supérfluas do tema tratado. Houve uma reunião do Comitê Central em que se discutiu, por exemplo, o tecido e as dimensões de faixas com palavras de ordem. Esses extremos – da generalidade à particularidade – desviam o foco do fato de que na verdade ali pouco ou nada se discute da administração do PCO.
Não há um planejamento de atividades (e quando há, as datas são ignoradas), não há um plano financeiro, não há orçamento anual, não há prestação de contas, não há planos de auxílio às regionais, as estratégias de agitação e propaganda (incluindo canais na internet) têm apenas seus números relatados e praticamente nenhuma sugestão ou crítica de qualquer dirigente é levada em conta pelos dirigentes responsáveis. Sem tratar desses temas fundamentais na organização política e essenciais à sua continuidade, o Comitê Central na realidade não define os rumos do Partido. Funciona como mera chancela “democrática” da diretriz do presidente – a qual circulará na imprensa partidária: “o Comitê Central decidiu que”…
### 3.8. Desorganização interna
Em praticamente todos os ramos de suas atividades, reina no PCO a desorganização administrativa – compensada quase que exclusivamente pelo esforço dos militantes em produzir exaustivamente a partir de comandos gerais. Rui Costa Pimenta faz questão de supervisionar pessoalmente todos os aspectos da vida partidária, mas faz pouco esforço para de fato dar solução aos problemas ou responder às críticas: trata-se de uma posição de fiscalização e de veto, mas raramente de organização efetiva.
Com isso, os familiares e dirigentes de mais alta patente têm por hábito esquivar-se de dar soluções práticas para as dificuldades, quando aparecem, alegando que não têm poder para fazê-lo. Normalmente, tentam desviar queixas para os “canais adequados” que nunca terão solução, na maioria das vezes porque simplesmente sequer são lidos. Se um militante reclama, por exemplo, por receber o jornal com excessivo atraso, respondem: “veja com seu coordenador de célula”, o qual teria que tomar algum tempo para redigir a queixa e encaminhá-la à Secretaria de Organização, cuja caixa de emails poucas vezes parece ser aberta.
É comum que novos militantes entrem livres de tais vícios e sugiram métodos e estratégias de organização. As sugestões também via de regra são ignoradas ou simplesmente recebidas atentamente e engavetadas. Se um militante, uma célula, um grupo toma uma iniciativa por conta própria, o normal é que ela seja desencorajada e “centralizada” pelo partido assim que começa a ganhar vulto. Recentemente, foi assim com *lives* feitas por militantes espontaneamente no Facebook, foi assim com os grupos de militância digital em redes sociais, foi assim com as tentativas de organização financeira autônoma das regionais.
“Centralizar” é o nome que o PCO dá para “intervir e desmontar”. Na verdade, a Direção Nacional do Partido não dá qualquer assistência financeira ou administrativa “centralizada” às Direções Regionais, as quais acabam sustentadas completamente pelos militantes, a maioria sem qualquer formação em controle contábil ou administração de negócios. O resultado é que, desejosos de fazer o partido funcionar, acabem pagando o custeio do partido de seus próprios bolsos – sem prejuízo do pagamento da cotização e dos jornais à Direção Nacional. Alguns acabam se afundando em dívidas pessoais.
A Direção Nacional do Partido não assume qualquer responsabilidade por tais problemas. Novamente, se os diretórios locais crescem, é graças à “política do partido” emanada da cúpula. Se fracassam, é graças à falta de convicção – ou confusão política – dos dirigentes e militantes locais. Como se disse, porém, os coordenadores locais não recebem praticamente nenhuma assistência financeira ou orientação administrativa da Direção Nacional: são deixados à própria sorte para, além de instruir e coordenar toda a militância e calendário de atividades, estruturar um sistema de arrecadação autônomo, o que acaba acarretando na escalada de dívidas pessoais descrita acima.
### 3.9. Orientação, ação, e responsabilidade
A execução da maior parte das tarefas partidárias pelos militantes é feita a partir de uma “pressão política” de caráter difuso para que o indivíduo se sinta compelido individualmente a realizar determinada ação de modo a manter-se aceito no grupo. O partido trabalha assim preferencialmente com o conceito de “orientação política” em detrimento de ordens diretas para a execução de determinadas tarefas.
Essa estratégia permite à direção manter-se no poder sem solucionar efetivamente os problemas reais com que os militantes lidam – conforme descrito acima no tópico sobre *desorganização interna*.
Tal técnica permite, por outro lado, que a Direção se isente completamente de responsabilidade pelas ações dos militantes a partir de suas “orientações” difusas. O caso mais extremo de tal isenção diz respeito ao estímulo do Partido ao uso indiscriminado da violência. O PCO frequentemente advoga a “formação de comitês de autodefesa dos trabalhadores” – comitês que até hoje não existem dentro do próprio partido. De modo acessório, na imprensa partidária são comuns artigos incentivando o uso da violência como método exclusivo para lidar com a extrema direita, ao mesmo tempo em que se provocam movimentos de direita a atacar o Partido.
Como resultado, é comum que os militantes, sem qualquer treinamento, instrução direta ou técnica, se lancem a atacar de iniciativa própria grupos de extrema direita em universidades e atos de rua. Quando o conflito não resulta em ferimentos sérios, com uma aparente “vitória” dos militantes do PCO, a ação é divulgada como exemplo bem-sucedido de “luta contra o fascismo” promovida pelo Partido. Evidentemente, com o crescimento da polarização política decorrente da crise, tais ataques terão consequências mais sérias. É de se imaginar que, em caso de ferimentos graves ou óbitos, o Partido agirá do mesmo modo que com as finanças: se algo vai mal, é responsabilidade do militante; se algo vai bem, é fruto do “acerto da política do partido”.
### 3.10. “Todo problema organizativo é na verdade um problema político”
A chave para relativizar todas as questões administrativas do PCO é a máxima acima. Rui Costa Pimenta já tentou apresentar várias passagens de Trotsky que justificariam o bordão que aparentemente é de sua própria autoria. É evidente que, do ponto de vista filosófico, descortinar os mecanismos psicológicos, econômicos ou políticos por trás de eventos cotidianos é parte da empreitada científica e intelectual da humanidade. Não é outra a contribuição de Marx e Freud, por exemplo.
No PCO, tal máxima é usada de alavanca omitir quase completamente a discussão efetiva de problemas organizativos. Se um militante se endividou, ou não consegue controlar as finanças de sua célula, por exemplo, o Partido não promove um treinamento financeiro, mas sim uma “discussão política” para tratar das discordâncias do militante com a política do Partido, entrando na maioria das vezes em seus problemas pessoais: o que faz com seu tempo livre, se deve ou não faltar ao trabalho, sua relação com sua própria família. Após tal discussão, o militante tem a impressão de que, se ele não consegue resolver seus problemas de militante sozinho, isso ocorre exclusivamente por culpa de sua própria falta de convicção política.
Caso o militante, ou o grupo, insistam em cobrar orientação e transparência, a reação da direção tanto pode ser ignorar solenemente a crítica, ou – caso veja risco de influência perniciosa – submetê-lo a demoradas reuniões para “discussão política” até que se “resolva o problema” – do militante. Jamais da Direção do Partido que, como já foi dito, é infalível.
### 3.11. Relação do Partido com o trabalho
Na visão de Rui e de sua família, o único trabalho digno é o de dirigente partidário ou militante profissional. Por meio de uma leitura enviesada do conceito de alienação em Marx, Rui concluiu que, se todo trabalho aumenta no sentido amplo a alienação do proletário e da própria burguesia, logo o trabalho fora do Partido ser forçosamente preterido em favor da militância.
Dois tipos de discurso complementam essa diretriz: o primeiro que caracteriza todos os problemas da humanidade e do mundo como advindos do Capitalismo – eximindo o Partido de tornar a vida do militante ou de sua base melhor. O segundo que desqualifica o trabalho de todas as categorias que o próprio partido organiza. Todos aqueles ligados ao serviço público ou aos bancários, por exemplo, são sumariamente classificados como *parasitas* que vivem como serviçais da burguesia que controla o estado. A Educação é vista como algo fútil e pouco efetivo para melhorar o mundo, já que somente a revolução trará a solução para todos os problemas. A universidade é vista como um antro de pequeno-burgueses preocupados somente com suas disputas intelectuais e incapazes de construir um movimento verdadeiramente revolucionário.
Assim como no caso do abandono da família, que veremos mais abaixo, tal concepção estimula nos militantes o abandono progressivo dos estudos e das profissões em favor da atividade partidária. É comum que muitos percam cargos, empregos, que abandonem suas carreiras, em função da dedicação excessiva ao Partido, que nem sempre terá em seu quadro um lugar para tal trabalhador. Se contratado pelo partido, sua situação se agrava sensivelmente. Com a administração financeira completamente caótica, é comum o atraso indefinido de pagamento de salários. Acresce que, quanto mais próximo do convívio pessoal com a direção, mais exposto o trabalhador fica às frequentes humilhações já descritas.
A vida do trabalhador no PCO poderia ser similar à vida daquele empregado em qualquer empresa de mesmo porte, se não fossem os labirintos argumentativos dos dirigentes para esquivar-se das obrigações de qualquer patrão. Alegam que o trabalhador de um partido de esquerda não pode se voltar contra o patrão, pois estaria se aliando à burguesia contra os seus próprios interesses de classe.
Alegam que os benefícios trabalhistas e receber em dia é “legalismo contrarrevolucionário”, entre muitos outros discursos indulgentes para com a omissão e incompetência truculenta dos dirigentes do PCO para administrar o partido. Desnecessário lembrar que toda reclamação de funcionários – militantes ou não – é vista como “campanha contra o partido” e combatida com os métodos já descritos.
A cereja do bolo de tal quadro opressivo é o fato de que ex-funcionários são tratados do mesmo modo que ex-militantes: são difamados, intimidados com ameaças a não se manifestarem publicamente sobre o que ocorreu entre as paredes do PCO. Se “todo problema organizativo reflete um problema político”, a política do PCO seria comparável não a setores socialistas, mas a governos de extrema-direita, substituindo-se o mito de nação pelo mito da revolução. Uma revolução que, diga-se de passagem, o PCO jamais promoverá.
### 3.12. Alta rotatividade dos quadros: exército de reserva de militância
O PCO sempre foi o menor partido legalizado do Brasil. Tal posição não foi conquistada por acaso. Se o número de filiados, ou militantes, cresce em demasia, aumenta a pressão interna pela prestação de contas, pela rotatividade da direção, pela eficiência da organização. Isso fatalmente coloca em xeque a hegemonia de Rui Costa Pimenta e sua família na Direção.
O primeiro filtro para reduzir tal pressão é o que diferencia *filiados* de *militantes*. É evidente que uma organização revolucionária precisa de *militantes* e não de meros filiados formais. No PCO, porém, tal ritual de entrada constitui uma válvula capaz de controlar, dentre os contatos, filiados e interessados, o número e o tipo de militantes que a Direção quer no Partido. Como se trata de uma organização pequena, a periferia partidária constitui o que se poderia mesmo comparar a um *exército de reserva* de militantes interessados em ingressar.
Por outro lado, todos os processos de desgaste dos militantes descritos até aqui geram uma constante evasão de quadros. Não apenas os já conhecidos episódios de “rachas” coletivos, como o do grupo de sindicalistas dos Correios que deu origem à atual Liga pelo Socialismo (LPS), mas nos anos recentes tem sido constante saída de dirigentes avulsos ou militantes profissionais.
Quando o partido perde pessoal, a direção convenientemente abre a válvula de incorporação de seu *exército de reserva* mantendo em suas fileiras somente aqueles que concordem com os seus métodos internos. Essa rotatividade é essencial à manutenção do grupo burocrático familiar no poder.
## 4. A política do Partido
### 4.1. Do fundamento idealista não se erguerá uma política revolucionária
Os vícios e métodos até aqui descritos tornam evidente que – conscientemente ou não – os dirigentes do PCO não têm por objetivo constituir um Partido revolucionário, mas sim um pequeno grupo de devotos, cercados por uma legião de admiradores/financiadores, capazes de mantê-los. Uma seita com santos, sacerdotes, monges e fiéis.
Por se tratar de uma organização política, e não religiosa, porém, há peculiaridades sobre seus mecanismos de funcionamento. Como a tradição marxista é pródiga em produzir teoria e literatura, o método do PCO é tratar os escritos de Marx, Engels, Lênin, Trotsky, James P. Cannon como verdade absoluta, extraindo passagens convenientes para cada uma de suas políticas, conforme o caso. Tais excertos são distribuídos aos militantes semanalmente, como seção teórica da *Circular Interna do Partido*.
#### 4.2. A teoria marxista como palavra da salvação
A teoria, para o PCO, não constitui fundamento para uma reflexão autônoma, com base no método materialista, mas apenas uma literatura de apoio a ser usada como argumento de autoridade – à semelhança do uso que neopentecostais fazem da Bíblia. Assim como no meio acadêmico, são meras citações destinadas a produzir credibilidade. É comum, por exemplo, o uso do texto de Trotsky *Da antiga à nova família*, para estimular o militante a se afastar de sua própria família. Na verdade, o Partido se submete ele mesmo a uma família apenas, que não tolera em absoluto a presença de outros grupos familiares mais extensos que um núcleo isolado.
É comum ainda o uso de textos de Trotsky e Cannon sobre o combate “à oposição pequeno-burguesa” dentro do Partido. Tomados isoladamente, tais escritos na verdade nada mais fazem legitimar o estabelecimento de uma casta burocrática em qualquer organização, a qual poderia facilmente tachar seus opositores de “pequeno-burgueses”. Poderiam servir de instrumentos até mesmo à manutenção de uma burocracia de viés stalinista.
A realidade é que Rui Costa Pimenta não tem uma trajetória política minimamente comparável à de Cannon e muito menos à de Trotsky. Não apenas porque sempre manteve seu padrão de vida estável nos 40 anos de militância, como também porque fez questão de aparelhar o partido com sua própria família. A direção, ela sim, é tipicamente pequeno-burguesa, e jamais teve um proletário em cargos da Direção Executiva. Do mesmo modo, comparar o Partido Bolchevique, responsável pela revolução russa, ou o Socialist Workers Party Norte-Americano (SWP) ao PCO é um despropósito verdadeiramente caricato. Basta pontuar que, em seu melhor momentos, o PCO nunca teve mais que 300 militantes espalhados por todo o Brasil. Desses, os verdadeiramente operários não chegaram a uma dezena. Mesmo esse quantitativo, porém, está quase que completamente desvinculado de efetivas organizações populares.
### 4.3. Ausência de trabalho de base
Reza a história do PCO que houve três momentos em que o Partido logrou alguma hegemonia no movimento sindical: com os metalúrgicos de Volta Redonda, nos anos 1980, com os trabalhadores dos frios, nos anos 1990, e nos Correios, nos anos 2000. A própria história dessa participação pode ser objeto de questionamento. Afora isso, o partido é conhecido por sua atuação nas categorias de professores e bancários – embora nunca tenha logrado nelas dirigir um sindicato.
As frentes de atuação popular do partido são a *Corrente Sindical Nacional Causa Operária*, o *Coletivo de Mulheres Rosa Luxemburgo*, o *Coletivo de Negros João Cândido* e a *Aliança da Juventude Revolucionária*, além do *Grupo por uma Arte Independente Revolucionária*. Há poucos registros de atuação em movimentos comunitários nem de trabalhadores rurais, bem como em grupos de luta pela terra ou pela moradia. Em geral, o PCO se mantém alheio a todas essas esferas por considerá-las irremediavelmente “burocráticas” e “reformistas”. Dirigentes sindicais e de movimentos populares são frequentemente tachados de “parasitas”, assim como os servidores públicos.
Embora os militantes sejam encorajados a tomar parte de todos esses movimentos, tal atividade é sempre preterida em favor de qualquer ato, de qualquer campanha política circunstante, de qualquer atividade social do Partido (inclusive feijoadas, churrascos ou o *Réveillon*). Toda atividade de organização de longo prazo é deixada de lado em benefício da campanha do momento.
Com isso, é evidente, o Partido carece de base real. O PCO não tem qualquer liderança efetiva em movimentos populares. Desde sua presença no Partido dos Trabalhadores, como tendência interna, a principal estratégia política da Causa Operária é agir como um grupo de agitação e propaganda que visa a influenciar os setores majoritariamente influentes do Partido, mas não a organizar diretamente os trabalhadores.
Aparentemente, o isolamento do PCO se acentuou a partir de sua expulsão em 1991 – o que os levou ainda mais rumo ao ultraesquerdismo – perdendo completamente a capacidade de pressão sobre o PT (sobretudo quando dos mandatos de Luiz Inácio Lula da Silva). Com os primeiros sinais do golpe de Estado, a partir da prisão de José Dirceu, o PCO viu nova oportunidade de exercer tal pressão, reivindicando para si o *slogan* de “o partido da luta contra o golpe”.
A estratégia foi bem-sucedida em certa medida. De párias no gueto esquerdista, foram alçados novamente ao primeiro plano da esquerda nacional, recebendo novo influxo de militantes. O PCO, porém, não soube usar tal impulso para organizar seu próprio trabalho de base. Insistiu e insiste até 2020 na estratégia de agitação e propaganda pura e simples, advogando a criação de *Comitês de luta contra o golpe* – núcleos de caracterização difusa que por vezes assumiam os nomes das campanhas do momento: *Comitê pela anulação do impeachment*, *Comitê pela liberdade de Lula*, *Comitê Fora Bolsonaro*.
Considerando a incapacidade administrativa do PCO em organizar seu próprio Partido, é evidente que tais agrupamentos não foram adiante por muito tempo, salvo aqueles mantidos pelo próprio núcleo de militantes. Acresce que a finalidade dos comitês, assim como a do PCO, era apenas levar adiante mais agitação e propaganda política “contra o golpe”, em lugar de lidar com os problemas locais de cada categoria, ou comunidade.
Além disso, é difícil imaginar por que motivo um militante petista, por exemplo, se submeteria por muito tempo a um comitê “centralizado” por militantes do PCO em lugar de frequentar o *Comitê Lula Livre* de seu próprio partido. De fato, os dirigentes e militantes de outros partidos percebem a manobra de “fazer política com a base dos outros” e a cada nova “campanha” do PCO vem isolando cada vez mais seus *Comitês*. Se mais de 700 pessoas acorreram à *1ª Conferência Nacional de Comitês de Luta contra o Golpe*, em julho de 2018, menos de uma centena (praticamente todos militantes do próprio PCO) estiveram na *2ª Conferência*, em dezembro de 2019. O Partido voltou a se isolar.
### 4.4. “O único partido revolucionário do mundo” – o ultrassectarismo do PCO
Em que pese seu discurso antissectário (como de resto todo partido trotskista, seguidor do *Programa de Transição*), a política do PCO sempre primou pelo seu isolamento proposital em relação a praticamente todos os demais setores da Esquerda. Perguntado sobre seu contato com outras organizações análogas, Rui Costa Pimenta frequentemente responde que não tem conhecimento de nenhuma igualável ao PCO. Se originalmente a Causa Operária nasceu no seio da Organização Socialista Internacionalista (OSI), na década de 1970, como um grupo especialmente próximo de Jorge Altamira, do *Partido Obrero* argentino, não apenas se distanciou da OSI na década de 1980 (desde então representada pela corrente *O Trabalho*, do PT), como também do próprio *Partido Obrero* na década de 1990. Fato é que hoje o PCO não participa de nenhuma das organizações que se reivindicam *Quarto-Internacionalistas*.
Uma certa dificuldade de narrar a história do PCO reside no fato de que somente os próprios dirigentes do Partido se interessaram em fazê-lo. E, quando o fizeram, omitiram propositadamente os nomes e feitos do grupo fundador – exceção feita à família Pimenta. O apagamento da história partidária é sintomático da progressiva concentração de poder nas mãos de Rui.
Mesmo na recente reaproximação ao PT, o PCO se manteve firme no propósito de se apartar dos grupos liderados pelo maior partido do país, criando seus próprios *Comitês*, alcunhando suas próprias palavras de ordem, discordando até mesmo quando apoiavam. Foi o caso do apoio do Partido à candidatura de Lula nas eleições de 2018, mas se posicionando frontalmente contrário à candidatura de Haddad – definida pelo próprio Lula. Em que pese haver condenado reiteradas vezes a palavra de ordem esquerdista do PSTU, “Fora todos”, orientou os militantes a defender o voto nulo naquelas eleições. Diretriz ultraesquerdista clássica do Partido desde sua criaçao e ainda persistente nas duas eleições de Dilma Rousseff.
O ultrassectarismo atingiu o nível máximo quando, a partir do segundo semestre de 2019, o PCO passou a chamar atos nacionais pela liberdade de Lula em Curitiba mesmo sem qualquer acordo com o próprio Lula e com a CNB/PT, na tentativa evidente de constranger o próprio ex-presidente a promover uma campanha por sua liberdade nos moldes do PCO: com atos demonstrativos de rua. Mesmo quando, em certa medida, a política do PCO foi um fator relevante em determinado movimento – caso da própria campanha pela liberdade de Lula – a cúpula partidária esquivou-se olimpicamente de converter tal sucesso em apoio político real por parte de outros grupos. Uma prova cabal de tal omissão foi a ausência de qualquer dirigente do PCO – muito menos de Rui Costa Pimenta – na procissão de líderes políticos que foram saudar o ex-presidente em São Bernardo no dia seguinte a sua libertação – evidentemente negociando a política da etapa seguinte.
Isolado, sem movimento de base real, o PCO não tem qualquer capacidade de mobilização expressiva. Os “atos nacionais” que promoveu nesse sentido sem acordo com o PT em Brasília ou em Curitiba não chegaram a contar com mil manifestantes. É recorrente a crítica de Rui Costa Pimenta ao “cretinismo parlamentar”, referindo-se ao hábito cenográfico de parlamentares de esquerda de promoverem pequenos atos dentro do Congresso Nacional. É de se questionar, em todo caso, que vantagem há em levantar cartazes para 500 manifestantes num ato esvaziado sobre levantar cartazes para 500 parlamentares no plenário.
### 4.5. O mito do “melhor analista político do Brasil”
Num golpe de vista sobre a política do PCO expressada em seus textos, é visível o desenvolvimento da habilidade retórica de Rui Costa Pimenta. Uma análise fria da política que Rui advoga mostra que na verdade o Partido manteve a mesma posição ultrassectária que sempre o caracterizou. Nos últimos anos, porém, há um arsenal de argumentos prontos – a maioria falaciosos – capazes de dar a impressão de que o Partido de fato opera em franco diálogo com outros grupos políticos.
O discurso de Rui, porém, é recheado de expressões involuntárias de seu sectarismo. A mais comum é “tem uma coisa que a maioria das pessoas não entende”, que serve como preâmbulo para alguma posição que somente o PCO advoga. Acrescente-se a isso o ritual semanal da Análise Política da Semana – um monólogo de horas de duração – em que após muitas digressões e uma sessão de perguntas sem direito a réplica, se cria a impressão de que se trata de fato de uma análise seguida de debate, e não de uma preleção sobre a opinião individual do dirigente sobre a conjuntura.
Na verdade, conforme já dito, é disso que se trata: da determinação da política do partido por um indivíduo, e não do debate de posições divergentes sobre o que acontece na realidade. As posições políticas não alinhadas à do partido imediatamente são refutadas com base na técnica da *falácia do espantalho*. O balanço dos atos do próprio partido é um verdadeiro show de prestidigitação que invariavelmente comprova “o acerto da política”.
A construção retórica de Rui é toda feita à base de enxergar o vermelho ou o preto, e mais nenhuma cor – para usar os termos de Trotsky. Em análise de fevereiro de 2020, por exemplo, afirmou que, como o presidencialismo de coalizão envolve conciliação de classes, um governo de esquerda no poder não possui **poder nenhum** e que o único e verdadeiro poder será conseguido somente por meio da revolução. Palavras fáceis para um líder político que jamais organizou sequer uma associação de bairro e que transforma em verdadeiro inferno a vida daqueles que vivem sob seu comando – no PCO, claro.
Outra radicalização sectária recorrente é atribuir à “democracia” um valor meramente ideal, que escamoteia uma verdadeira ditadura da burguesia. É indiscutível que este é um dos fundamentos do marxismo quando se trata do regime em que determinado país vive: a “democracia burguesa” de fato é uma máscara para uma verdadeira ditadura de classe. Há porém, no próprio dizer de Trotsky, outras democracias possíveis, como a democracia operária (os sindicatos, os movimentos populares, de organização independente). No contato de tais movimentos com o aparato estatal, há uma pressão democrática real, com conquistas difusas em várias instâncias de poder. Trata-se da própria materialização prática da relação de forças na luta pelo poder. Na tática argumentativa de Rui Costa Pimenta, porém, não haverá qualquer democracia sem revolução.
A palavra de Rui em reuniões internas tem ainda o condão de alterar a realidade, se militantes revelam que determinado panfleto não é bem aceito pela população, Rui insiste que são bem aceitos, e que o problema está no militante. Se um ato foi esvaziado, Rui diz que para o tamanho do partido o ato foi cheio. A manipulação de números em balanços internos é também frequente. É comum, por exemplo, o uso de percentuais que na verdade exprimem variações absolutas insignificantes – dentro de uma margem de erro estatística. Se num ato há dez pessoas, por exemplo, e no segundo ato há 20, Rui faz questão de reafirmar que “dobrou a mobilização”, quando na realidade ambos atos foram pequenos e irrelevantes. Esse engano, ou autoengano, frequente se presta a manter a militância engajada em palavras de ordem fracassadas, na realidade.
Criou-se o mito de que Rui seria um grande analista político, quando na verdade toda sua análise – dentro ou fora do partido – é um grande jogo retórico e falacioso que não se destina a apreciar a realidade, mas a orientar a política do PCO, mantendo-o tal como é: pequeno, pouco influente, a serviço de seu grupo familiar. Como se viu, as palavras de ordem do Partido – alcunhadas por seu presidente – na verdade constroem o muro de seu isolamento.
#### 4.5.1. Ausência completa de autocrítica
Mesmo as famosas “previsões acertadas” de Rui não são mais que tautologias. Que havia um golpe de estado em curso no país era algo fato consumado para qualquer observador atento desde os atos de 2013, e não uma "previsão". A escala da insurreição popular sem lideranças era indício claro de que havia uma orquestração nesse sentido, secundada pela imprensa e pelo braço judicial que já encarcerara José Dirceu. O PCO difundiu então a narrativa de que Rui fora o único a “prever” o golpe de Estado. Era corrente entre [quem estava nas ruas](https://ultimosegundo.ig.com.br/brasil/sp/2013-06-21/em-sp-manifestantes-se-dizem-contra-partidos-e-sao-ironizados-por-anarquistas.html), e entre [articulistas políticos](https://medium.com/primavera-brasileira/que-golpe-a321b6486c20), que essa era uma possibilidade presente. Em importantes momentos, a análise do PCO mostrou-se amplamente equivocada. Tais desacertos jamais foram reconhecidos em instâncias internas – e muito menos externas. Vejamos três exemplos.
Ao abraçar a campanha pela anulação do *impeachment*, o partido esperava obter amplo apoio popular, que jamais se concretizou. Tratava-se, evidentemente, de uma política recuada, subordinada aos desígnios do STF e destinada a perder qualquer sentido maior à medida em que se aproximavam as eleições de 2018. O partido mantém até hoje que tal política foi “acertada”, e que era a “única palavra de ordem capaz de levantar as massas”, numa ausência completa de leitura dos próprios campos internos do Partido dos Trabalhadores, que abertamente haviam virado as costas para a Presidência perdida.
Rui passou todo o período eleitoral de 2018 afirmando peremptoriamente que a candidatura de Bolsonaro era um mero “espantalho” destinado a concentrar os ataques da esquerda, permitindo a vitória de outros candidatos da direita, como Alckmin. Seguindo tal erro de avaliação, o PCO não fez qualquer campanha veemente contra Bolsonaro no período eleitoral, tentando redimir o erro com o lançamento precoce da campanha “Fora Bolsonaro”, ainda às vésperas de se concluir o segundo turno.
Por fim, até 2020, o PCO não reconheceu que toda a alavancagem do próprio nome de Lula no período eleitoral se prestou, na prática, à promoção da política eleitoral do próprio Lula – a qual é veementemente rechaçada pelo PCO, que vê unicamente na mobilização popular a solução para todos os problemas.
### 4.6. Imprensa partidária: o pior do melhor
Em tese, o Jornal Causa Operária (JCO), semanal, e o Diário Causa Operária, online (DCO), representa talvez o que há de melhor em imprensa de esquerda no Brasil. É escrito, editado, impresso, distribuído e vendido por militantes.
Na tradição marxista-leninista, a imprensa é o principal instrumento de organização de um partido revolucionário. A escrita pelo próprio militante o coloca na contingência de ter que ler com olhos críticos a realidade que o cerca – na verdade, aumentando a sua sensibilidade política no dia-a-dia. A escrita organiza a crítica e constrói uma análise do fato. A produção do jornal agrega valor de troca para a organização. Sua frequência, distribuição e venda disciplinam as atividades do partido. O contato do militante com o leitor, que também participa da realidade ali descrita, conecta o partido ao trabalhador. A identificação do trabalhador com os problemas ali narrados conecta o trabalhador ao partido, mobilizando-o. Em seu conjunto, o partido produz um acúmulo de análises dos fatos que constituem a análise de conjuntura do coletivo, a qual pode ainda ser sintetizada em encontros partidários periódicos.
Na prática do PCO, porém, o jornal não funciona assim. No DCO, reunião de pauta diária é feita por um reduzido grupo de três ou quatro pessoas, que distribuem matérias pré-pautadas aos militantes, segundo uma meta arbitrária de número de artigos diários (eram 50 por dia nos últimos anos). Os temas não se relacionam à atuação dos militantes nas frentes. São, quando muito, uma propaganda inflada das ações do Partido. Via de regra são apenas um mero *clipping*, com atraso, da imprensa em geral – de direita e de esquerda – e a função do redator é somente aplicar “a política do partido” a determinado fato que muitas vezes pouco tem a ver com sua realidade, sua capacidade de análise ou mesmo de redação. Os prazos para redação são exíguos (normalmente uma tarde). As instâncias de revisão ou inexistem ou são renitentemente ineficientes.
O resultado são textos muitas vezes mal-escritos, com fontes de segunda mão, feitos às pressas, sem reportagens, sem pesquisas, sem uma reflexão apurada, encabeçados por uma manchete exortativa ou alarmista. Ao fim e ao cabo, a conclusão da “análise” política deve seguir a “orientação” emanada previamente por Rui Costa Pimenta em suas preleções semanais. Se em outros tempos o próprio Rui escrevia e trabalhava na edição do jornal, não foi sua prática nos últimos anos. O dirigente dá mostras de que, na verdade, sequer lê o jornal – quando faz em palestras comentários contraditórios às matérias anteriormente publicadas, sem que se tenha posicionado sobre elas.
A edição do jornal impresso é feita a partir das matérias do DCO por um grupo de dois ou três dirigentes, sem qualquer transparência sobre o processo editorial. Há um comitê editorial permanente? Como é escolhido? Quem redigiu a manchete principal? Quem a escolheu? Não se sabe.
Coleções antigas mostram que o JCO já teve melhor qualidade: textos bem escritos, com revisão e boa impressão – embora com menor frequência, tiragem reduzida e preço relativamente alto. Não é a realidade atual. O jornal é pequeno, mal-impresso, diagramado de modo amador, repleto ainda ali de erros de ortografia e de revisão. Poucas matérias se salvam num número de JCO – normalmente as secundárias.
O número de jornais que um militante deve vender é definido por sua antiguidade no partido e cresce indefinidamente. A cota inicial é de 10 jornais por semana. Há militantes encarregados de vender 50 jornais por semana – ou pelo menos de pagar por eles, caso não os tenha vendido. Desnecessário ponderar que um proletário ou vende os jornais em seu local de trabalho ou fica inadimplente, que um desempregado não tem nem tempo nem dinheiro para vender ou pagar jornal, que um militante de classe média acaba pagando por todos sem vendê-los. O JCO na verdade não organiza nada. Trata-se apenas de um simulacro fantasioso do método leninista.
O Partido é pródigo em desqualificar os demais jornais de esquerda como “meros procedimentos burocráticos” feitos por profissionais contratados e não por militantes, os quais são feitos quase que “por obrigação moral” pelos demais Partidos. Tal afirmação não é de todo inverídica. O verdadeiro jornal de esquerda deveria ter o método de elaboração advogado pelo PCO, auxiliando na organização do Partido. Na prática, porém, é evidente que iniciativas como o *Brasil Popular*, editado por vários grupos do PT tiveram em pouco tempo resultados muito superiores aos do JCO, atingindo um público muito mais amplo, financiados por doações, com uma produção mais profissional e ampla distribuição pela militância petista. O melhor do pior parece ser bem mais eficiente que o pior do melhor.
## 5. O que ainda se pode fazer? – para além da crítica ao PCO
### 5.1. Impossibilidade de alteração da estrutura interna do Partido
A estrutura fossilizada – que nada tem de dialética – é, como se viu, consequência de uma completa identificação entre Rui Costa Pimenta e sua família com o PCO. Caso se vejam de fato ameaçados em uma disputa interna, a tendência natural é que abram um conflito capaz de dissolver o Partido. Produzir ataques externos a seitas e agrupamentos como o PCO também tem pouco efeito prático, uma vez que há um grande contingente de militantes em potencial prontos a abraçar sua causa. Avançar juridica e politicamente contra o Partido, em campo aberto, seria um prato cheio para a direita – capaz de usar o PCO como exemplo de “corrupção” – reforçando assim a narrativa corrente que busca criminalizar toda a esquerda.
É necessário ao militante egresso do Partido compreender os erros e o sectarismo ultraesquerdista da política do PCO antes de avançar em quaisquer planos. É preciso entender que o viés idealista e oportunista do PCO produziu um modelo de militância pouco efetivo, carente de organização de base, é premissa para evitar cair em outros grupos análogos – sobretudo aqueles oriundos do PCO.
### 5.2. Pela prevalência da experiência prática
A verdadeira superação política do PCO para um ex-militante ou grupo de ex-militantes não se limita à reflexão ou à redação de notas, artigos ou manifestos. Parece ser claro que, se o PCO peca pelo isolamento e pela ausência de trabalho de base, o caminho natural para uma ação militante consequente para além do PCO é a atuação em conjunto com movimentos populares verdadeiros, o aprendizado genuíno com sua experiência em lugar da arrogante “orientação política” unilateral emanada de um guru. É parte da política tanto saber propor quanto saber ouvir para entender os verdadeiros anseios da população.
Tal atuação prática é evidentemente tão mais viável quanto mais próxima da realidade do próprio militante. Deslocar elementos de classe média para a periferia, com a intenção de organizar os movimentos comunitários artificiais, evidentemente coloca a tal militante uma barreira de classe de difícil transposição. O natural é que cada militante busque os meios de militância mais próximos de sua realidade: o movimento sindical para os trabalhadores sindicalizados, o movimento de luta pela terra para os camponeses, o movimento de luta pela moradia para que moram em ocupações, acampamentos e tugúrios.
Priorizar a prática à orientação conceitual, a integração aos movimentos em lutar do isolamento, pode ser o antídoto necessário a uma atuação política mais efetiva que a do PCO.
### 5.3. Necessidade de imprensa e de formação constante: é possível alguma unidade na ação?
É necessário aquilatar, por outro lado, que mesmo em meio a tantos erros, alguns resquícios de prática verdadeiramente revolucionária e capaz de organizar a população foram aprendidos por aqueles que passaram pelas fileiras do PCO.
Um jornal popular, escrito publicado e vendido – ou distribuído – pelos militantes, de fato é capaz de organizar a população – na boa tradição do marxismo-leninismo. Fazê-lo de modo integrado ao povo, retratando sua realidade, seus desejos, seus problemas, como subsídio a uma boa análise política é de fato o ponto central de uma boa atividade militante.
À luz do marxismo, a escrita política sobre a realidade é o mais saudável desafio de elaboração conceitual para todo aquele que pretenda militar por uma política capaz de mobilizar as pessoas que vivem aquela realidade. A narrativa geral não pode ser fruto de um indivíduo, mas de um acúmulo de narrativas locais.
Neste método, é fundamental que ocorram atividades formativas periódicas para os membros de um coletivo militante, de modo não apenas a igualar todos como alunos, reduzindo as resistências naturais impostas pela vaidade, como também de modo a promover um genuíno debate e confronto de ideias divergentes. Como reza a verdadeira dialética, é com o acúmulo de divergências explícitas que se torna possível obter uma certa unidade na ação.
Atuar em movimentos reais próximos da realidade do militante, concentrar o debate numa boa imprensa de esquerda, promover encontros de formação periódicos: essa a sugestão que temos a fazer para uma atuação política mais além do PCO.
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